31/12/2015

Minha formatura do ensino médio



Um sonho de quase todos os adolescentes: Terminar o ensino médio, conquistar a tão desejada liberdade, curti a festa com os amigos e em fim passar no vestibular. A teoria é linda, mas o que me aconteceu mesmo...
Eu acho que fui a única garota dentre todos que não foi na formatura do ensino médio. Comemorar o quê? Na verdade, eu deveria ter posto aquela roupa preta. Não me interprete mal, a questão não se trata de arrependimento, eu realmente deveria ter me vestido de preto e não sorrir nas fotos, deveria ter reverenciando o luto pelos anos no cárcere, e velado a hipocrisia de momentos, digamos, que nunca aconteceram.
Durante todo o percurso e tempo que passei na prisão, vi, revi, vivi e presenciei momentos dos quais não me orgulho. Aquele lugar deveria ser meu queridinho, meu queridinho... o lugar onde tudo pudesse brotar, nascer e dar frutos, um lugar que deveria ter acontecido as coisas mais fantasiosas, ridículas e bobas na vida de uma adolescente que esperou por tudo isso e por mais um pouco. Na verdade, eu não tive o que chamam de sorte. Imagine agora uma gaiola gigantesca no cume de uma montanha, dentro desta um pequeno ser, com penas pretas e olhos brilhantes escuros, talvez uma aberração, triste, sozinho e sem voz no alto da montanha impotente diante de tudo, apesar de estar nas alturas. Era assim, dia após dia era assim que eu me sentia naquela cadeia que chamam de colégio. Como se não bastasse, durante o meu regime semiaberto, quando eu tinha algumas horas de liberdade fora do calabouço, arrastando sempre um All Star preto surrado, que já fazia parte dos meus pés e uma mochila quase sempre cheia de livros didáticos inúteis, aquela sensação de uma presa que sofria maus tratos, torturas e a rejeição de todos, refletiam na minha vida fora daquele cenário, que para mim era tenebroso. Mas que crime eu cometera para passar por tudo isso?

Volto agora há mais alguns anos, me transportando para um passado pouco distante nas águas da minha infância.

Sempre fui uma menina quieta, pelo menos é o que minha mãe dizia... e com o passar do tempo, ainda muito pequena fui jogada na cadeia, e lá sempre impuseram sobre todos os detentos ensinamentos, normas, e um monte de coisas que diziam ser boas para a sociedade. Bobos e ingênuos, a maioria de nós acatava o que a tutora dizia. No meio de toda aquela esfera, onde tudo era brincadeira, alguns dos detentos não eram assim tão bobos, haviam aqueles que queriam mexer com aqueles outros que nada de mais faziam. Eu realmente não tive o que chamam de sorte, e assim fui vítima desses mexilhões. O tempo como sempre passara e de tanta coação sofrida, resolvi entrar no meu universo e ali descobrir um mundo. Meu universo não tinha nada, não tinha ninguém... era um vácuo nas galáxias, imensurável, lindo, mas vazio, repleto de sentimentos ruins e malignos. A culpa foi deles? Eu paguei por um crime que outros cometerão, crimes onde eu fui a vítima?! ... Eu não sei... A linha desse pensamento sempre se torna um círculo e termina sempre nas roupas pretas da formatura que não foram vestidas.
Da gaiola no cume, porém com um ser preso; do universo vazio, porém lindo, até o agora. Tudo isso já faz um tempo e olhando tudo das lentes das memórias, vejo que pouca coisa mudou... Será que foram minhas atitudes que não deixaram eu colocar o roupão negro? E quando eu resolvi entrar no universo lindo... por que nunca houve alguém que me chamasse para fora? Era tudo o que eu precisava, meus olhos não estavam tapados, meus ouvidos menos ainda e meu coração, mesmo quebrado estava cheio de amor e esperança. Esperei, esperei, mas não obtive um socorro; gritei, mas ninguém ouviu; corri atrás de pessoas que pareciam me querer por perto, mas sempre me enganei... Aquela roupa preta, aquele chapéu preto... por quê? Será que a culpada foi eu? São tantas as perguntas que nunca obterão respostas...
De fato, o ensino médio marcou a minha vida. Marcou tanto que as feridas ainda não foram saradas... e tudo isso não é nem um terço do que de fato lá eu passei. Meu cárcere.